Dissecando: Faith no More — Sol Invictus
O primeiro disco depois de 18 anos da minha banda preferida merece textão.
Tem bandas que merecem um post só pra falar delas e é impossível não ser o caso dessa vez.
Faith No More é minha banda preferida desde 2007. Conheci os caras quando meu ex-chefe fez questão de me mostrar o vídeo de Ashes to Ashes no já existente YouTube. Ele não acreditou que eu ainda não conhecia a melhor banda do universo, ficou completamente indignado. Na verdade eu nunca tinha dado a mínima importância pro FNM, achava que era só uma dessas bandas velhas desinteressantes e eu nem sabia que eu escutava todos os filhotes renegados da vida e obra desses monstros.
Desde então eu venho sofrendo a cada notícia e evento novo: comemorando a volta em 2009, não indo no show do Maquinária no mesmo ano, indo no do SWU em 2011 (apesar das mais de 10 horas embaixo da chuva) e finalmente o milagre do novo CD em 2015.
May the dead live. And the dead live.
Engraçado dizer que eu e os sul-americanos fomos os primeiros a provar um pouco do que seria o vindouro Sol Invictus com a execução da inédita Matador, ainda sem nome na época, nos shows daquele feriado de Novembro de 2011. Uma grande expectativa foi criada em torno daquela música que seria a primeira criação da banda depois de tantos anos, uma fagulha de esperança para um novo CD. E era mesmo. A música foi totalmente contundente e com uma mensagem clara em sua letra: We served you well, now we’re comin’ back.
2015 e a banda está a todo vapor, com shows realizados e marcados praticamente no mundo todo, inclusive aqui no Brasil. Além disso, o Sol Invictus também já conta com dois singles oficiais: Motherfucker e Superhero. Mas hoje eu queria mesmo falar sobre o resultado de tantos anos de espera e a percepção de uma fã de uma geração mais recente da banda. Nem tinha como ser diferente, já que quando eles lançaram o King for a Day… Fool for a Lifetime, por exemplo, eu tinha apenas 7 anos e estava sofrendo lavagem cerebral através da Globo assistindo o programa da Xuxa.
A clareza e a loucura de Sol Invictus
Apesar do CD ter caído na net no meio de Abril eu decidi soltar este texto apenas hoje, dia seguinte em que uma audição oficial foi liberada no site NPR Music e no Soundcloud com uma qualidade muito melhor do que as vazadas anteriormente. Você pode clicar aqui e ouvir o quanto você quiser, obrigada, de nada.
Antes de qualquer coisa, vamos nos lembrar que CDs de retorno dificilmente são aclamados por fãs e pela crítica, já que a grande maioria está fora de forma e atrás só de um bom sensacionalismo para ganhar uma grana extra. Quem acompanha o Faith No More até teve essa impressão de que este era mais um caso quando os primeiros shows da turnê Reunited começaram a acontecer, mas com o tempo a coisa ficou tão harmônica que a gente até esquece que a banda se separou um dia.
Claro que essa harmonia se reflete de maneira cristalina no disco Sol Invictus. A banda provavelmente passou tempo demais junta pra ignorar os seus conhecidos instintos criativos e, pela primeira vez em toda a sua história, lançou um trabalho que deixa escancarada essa parceria sinérgica e descompromissada. Se tem uma palavra para definir a sensação que eu tenho ao ouvir este disco é leveza, mesmo em seus momentos mais escuros.
Apesar da conhecida esquizofrenia musical, que é uma característica forte da banda, existe uma lógica muito interessante na evolução das canções. É como se tudo se encaixasse perfeitamente e estivesse contando uma história. Além de manter a identidade e conseguir transparecer o atual momento, todos os integrantes trouxeram a bagagem destes anos separados para o disco.
O trabalho vocal de Mike Patton é certeiro e talvez um dos mais versáteis até agora no Faith No More. As influências dos seus projetos paralelos estão presentes, mas apenas acrescentam e não confundem. Vale ressaltar a participação muito efetiva do John Hudson nos riffs suculentos como os de Separation Anxiety e a expansão musical de Roddy Bottum, que transcendeu os teclados para as vozes de Motherfucker e o violão em From The Dead e Black Friday. Vale sempre ressaltar que a cozinha da banda, Billy Gould e Mike Bordin, é o grande alicerce e responsável por manter pela identidade única do grupo.
O início dos trabalhos com a canção título, a soturna e abrupta Sol Invictus, é cheio de questionamentos sobre a fé e um grande pedido de desculpas por ficar longe de algo sagrado e antigo. Já o encerramento, com o belíssimo hino dark Matador e a folk-festiva From The Dead, todas as respostas a ausência são colocadas de maneira clara e até mesmo acolhedora. Mas o que será que acontece no meio dessa trajetória de 40 minutos?
Show em Show Santa Ana, Califórnia (EUA), em que a banda tocou o novo disco quase completo
No entanto não tem quem me tire da cabeça que Sol Invictus é quase em sua totalidade uma crítica a nossa sociedade e suas doenças emocionais causadas pela cultura compulsiva-obsessiva de informação e consumo e como isso afetou a banda e seus integrantes desde seu retorno aos palcos. Essa impressão que tive quando eu li as letras das músicas. Talvez a minha interpretação seja completamente rasa pois as letras não são 100% confiáveis.
Separando a teoria da prática, recomendo fortemente a sequência de faixas Sunny Side Up, Separation Anxiety e Cone of Shame, o ponto alto de todo o CD. São faixas que coroam a grande crescente do CD e são muito intensas. Black Friday, Matador e Superhero também tem todo o meu coração. Mas isso não significa que o resto do disco não seja maravilhoso. O único defeito para os fãs diehard é que a experiência é rápida demais, com apenas 40 minutos.
Que incrível ano que vivemos na música. Pelo menos pra quem gosta de música boa. Provavelmente Faith No More voltou a produzir esse ano para reacender a chama dos limites criativos do mainstream que está muito mais do que morta.
Que sejam bem-vindos por muitos anos. Vida longa a melhor banda do universo ❤
Texto publicado originalmente em medium.com/@nebelin3